A característica impulsiva da pessoa com TDAH potencia uma aproximação e abordagem à pessoa com quem pretende relacionar-se afetivamente, de uma forma direta, sem acautelar as consequências, manifestando o seu interesse espontânea e intensamente. O entusiasmo consegue ser tal, que comumente acontece perderem-se em longas apresentações, como quem quer dar-se a conhecer de uma só vez, amontoando temas de cariz pessoal uns nos outros e em catadupa, num discurso sem uma linha condutora, em que a páginas tantas já não se lembra por onde começou. Nestas circunstâncias, não vale a pena tentar pará-la, porque não vai permitir, pelo contrário, com o embalo do entusiasmo, aguçará ainda mais a sua tendência para se prolongar de uma forma que parece infindável, num desfilar de palavras avulso sobre tudo e sobre nada.
Paralelamente, igualmente, movida pela impulsividade e intensidade das suas emoções, tende a procurar uma proximidade física mais cedo do que seria suposto, numa entrega total e num à vontade que geralmente só se consegue numa fase bem mais adiantada de convivência em casal. Tanto em palavras, como em atos, existe a propensão para se colocar de imediato tudo a nu e ao dispor, comprometendo a outra parte a um vínculo afetivo súbito sem tempo para poder refletir e planear em consciência um relacionamento que, também, quer, por isso nada mais lhe restará senão deixar-se levar no embalo do entusiasmo, sob pena de defraudar as expectativas da pessoa com TDAH, frustrando-a e consequentemente correndo o risco de a perder, da mesma forma como a ganhou, ou seja, de imediato.
Esta intensidade e entusiasmo inicial poderá durar uma semana, aproximadamente, assim como, de um dia para o outro, a pessoa com TDAH, por uma simples palavra que a deixou confusa, pura e simplesmente de forma abrupta consegue afastar-se sem mais explicações e votar-se a um considerável tempo de silêncio, deixando perplexo e sem qualquer justificação o seu par, a quem nada mais restará senão aguardar pacientemente pelo próximo ciclo, o da reaproximação, que não tardará muito estará aí “à porta”, onde suavemente a pessoa com TDAH bate, ao jeito doce de quem quer entrar para assaltar.
Nestes casos de maior impacto, trata-se, efetivamente, de um assalto à vida de quem se torna a escolha afetiva de uma pessoa com TDAH, onde tudo que tem de mais precioso lhe é roubado e nada é deixado, desde a paz, à clarividência, passando pelo ânimo, a força física e a estabilidade emocional, tudo lhe é tirado numa alucinante experiência em que não existe hora certa, nem lugar certo, onde as coisas pairam no ar, nada é concreto, ou objetivo, em que as decisões são permanentemente chutadas para diante sem nunca se chegar a conclusão alguma, tudo é vago, desaguando, invariavelmente, num eterno passo atrás para uma nova tentativa de recomeço, ciclo após ciclo, esgotantes ciclos de auto esgotamento por parte da pessoa com TDAH e consequentemente de esgotamento por simpatia de quem está a seu lado.
Porém, das pessoas com TDAH, existe quem consegue encontrar mecanismos de auto proteção e após meio dia perdido em infindáveis, esgotantes e estéreis comunicações, e/ou em busca das coisas que, entretanto, perdeu pelo caminho, levando consigo para esse turbilhão quem está ao seu redor, inquinando o ambiente, a meio da tarde lá se recolhe umas horas nos seus aposentos para descansar do cansaço auto infligido, enquanto quem com ela convive fica a arrumar o estrago e a compensar o tempo perdido, para depois do seu descanso, a pessoa com TDAH, reaparecer retemperada de energias, disposta a “baralhar e dar de novo”.
Se quem partilha a vida com uma pessoa com TDAH estiver à espera, no final de uma longa e cansativa viagem, de uma cama para descansar um pouco, bem pode tirar daí a ideia, porque o mais provável é acabar por perder esse tempo à procura da chave de casa que o seu par não se recorda onde deixou e caso tenha a sorte de a encontrar num curto espaço de tempo, deve ponderar a possibilidade de a seu lado, na cama, vir a ter alguém ao telemóvel a importunar o seu sono, porque, afinal de contas está fresca por ter passado metade da viagem a dormitar em vez de fazer companhia a quem conduzia. Ou, pela manhã de um domingo, se lhe perguntar o que gostaria de fazer nesse dia, na esperança de ouvir a palavra mágica, “descansar”, o mais provável é ficar sem resposta, mas com a cabeça cheia de informação sobre agendamentos para um ano inteiro com terceiras pessoas, fruto de interesses meramente pessoais, que nunca têm em conta as necessidades do seu par, tampouco as de descanso. Trata-se de uma espécie de egoísmo implícito em ações não pensadas, como resultado de uma impulsividade descontrolada que não olha a quem para ser satisfeita.
A dualidade comportamental em idênticas circunstâncias pode ser gritante nos casos de TDAH, deixando, inclusive, a ideia de existir alguma bipolaridade associada, porque, por exemplo, tanto entram num jogo de tabuleiro com enorme afinco, querendo vencer à viva força, usando todas as estratégias e artimanhas para levar a sua por diante, monopolizando o ambiente que supostamente era para ser de mera descontração e passatempo, num agitado cenário de guerrilha, como, na semana seguinte, perante o mesmo jogo, apresentarem uma apatia tal que tanto lhes faz como lhes fez, vencer ou perder, revelando um desfoque por demais evidente.
Toda esta agitação, novidades, desafios, emoções, eternos recomeços e afins, funcionam como compensação para as dificuldades neurotransmissoras a nível do lobo frontal que impedem a devida regulação da dopamina na pessoa com TDAH, servindo, portanto, o seu par e tudo aquilo que dele possa extrair no máximo aproveitamento da sua disponibilidade, como uma espécie de tónico complementar para essa carência. Porém, rapidamente esgota a fonte, ao “servir-se” incessantemente dela e quando tal acontece, o mais provável é abandonar essa fonte e ir em busca de outra que reative o seu entusiasmo, até, também, a esgotarem e assim sucessivamente, que poderão ser fontes não humanas, claro está, pois, é muito comum nas pessoas com TDAH se refugiarem em consumos excessivos em jeito de compensação, como, por exemplo, ingestão de alimentos pouco saudáveis, ou busca de atividades socioculturais em catadupa, tudo coisas de prazer imediato.
É, de destacar, nesta “correria” desenfreada imposta pela pessoa com TDAH, o seu pior registo, a comunicação, aquilo que mais a compromete e denuncia. Tendem a revelar uma deficitária capacidade de ouvir as outras pessoas, com uma forte tendência a imporem a sua vontade e opinião, que a esgrimem até à exaustão, querendo sobrepor os seus interesses e convicções a todo o custo aos interesses e convicções das outras pessoas, sendo muito provável, a título de exemplo, que caso entendam que um filho deva seguir um determinado curso que não aquele que o filho quer, são capazes de andar dias a fio a pressionar nesse sentido e a arranjarem mecanismos muito ardilosos para o tentarem convencer a mudar de ideias, nem que isso implique com a felicidade do filho e o ambiente em casa. É, pois, muito comum o mau ambiente em família quando se tem por perto alguém com TDAH, algo que até podem reconhecer, porque os factos não o podem negar, assumindo-o em frases esclarecedoras como: “já não me suportam!” Sim, é um facto, é difícil suportar o ambiente constante de agitação quando gerado por uma pessoa com TDAH, um desconforto para quem tem de andar sempre envolvido, sem responsabilidade alguma, em busca de algo perdido, ou numa discussão recorrente de semanas por algo estéril, ou ainda porque, nada muda, por muito que se fale e aconselhe.
Ainda no contexto comunicacional, resumidamente, poder-se-á dizer que a pessoa com TDAH tenderá a falar quando não deve e a silencia-se quando deveria falar, por isso, não se deve esperar de uma pessoa com TDAH aquela palavra de alento quando se está angustiado, o mais certo é ficar em silêncio, alegando sentir-se angustiada por ver o seu par angustiado, numa clara inversão de papeis. Também, não se deve esperar ter voz ativa em qualquer debate de interesse comum, porque quando a pessoa com TDAH começa o seu discurso, dificilmente deixa falar e se o fizer, logo a seguir interrompe para mais um longo discurso, não retendo uma só palavra do que a outra parte tentou dizer, sendo bem provável, ainda, que ao terminar os seus prolongados monólogos, diga frases tão curiosas quanto: “cada qual já transmitiu as suas opiniões”; “já estamos esclarecidos”; “ficamos conversados”; ou “está, então, assim decidido”… sem sequer a outra parte ter tido a oportunidade de se manifestar.
Esgotado o “frasco do tónico” num trago só, assim como no início, as ruturas feitas pela pessoa com TDAH poderão ser revestidas de forte impulsividade, feitas sem dó nem piedade, deixando a clara ideia de uso, abuso e depois deitado fora, o que, de facto, na prática é o que acontece, existindo ou não intenção. Porém, por muito indigno que pareça para quem passa por isso, existe uma espécie de alívio aquando da libertação dessa enorme carga de agitação diária, num retomar ao tempo e espaços certos, num ritmo saudável e produtivo, criando nas pessoas que foram vítimas destas circunstâncias, ao olharem para trás, a sensação que a velocidade de acontecimentos foi tal, que um mês decorrido, parece equivaler a um ano e assim sucessivamente e de forma inglória, ficando apenas um extremo cansaço físico e mental dentro de um enorme vazio temporal.
Para quem observa a pessoa com TDAH, parece que a vida soma e segue como se nada fosse, de preferência “agitando a bandeira” da pessoa incompreendida – manipulação – existindo, inclusive, quem tente transmitir a ideia que a pessoa que deixa para trás esgotada, usada e abusada, é quem tem uma mente com problemas e que precisa de ajuda, pois, uma das outras características que poderão acontecer nas pessoas com TDAH é a dificuldade em o reconhecerem e, muito mais em aceitarem o diagnóstico, o que se compreende, pois a palavra “transtorno” é profundamente estigmatizante.
Não serão propriamente más pessoas, apenas nasceram com este problema e, naturalmente, têm de ser compreendidas ao abrigo disso, desde que se queiram tratar. Contudo, são pessoas como todas as demais no que concerne à personalidade, cada qual com a sua e, nestes casos em particular, uma personalidade humilde, naturalmente, facilita as relações e ajuda a atenuar o problema, assim como o contrário se torna um duplo problema para a própria pessoa com TDAH e um problema para quem está por perto, sob pena de acabar por ter de se resignar, anulando-se até ao passo seguinte, a tristeza e por último, constatar a insustentabilidade de uma relação assim.
Não subestimar esta realidade já seria um bom começo para se poder ajudar quem sofre de TDAH e evitar danos colaterais, mas infelizmente a sociedade atual continua de costas voltadas para a causa alheia, acomodando-se no superficial que é sempre muito mais fácil de encarar, pois, não dá trabalho como daria o aprofundar de ideias e soluções em benefício do coletivo.
Nunca é tarde para se abraçar uma boa causa e dar a mão a quem sofre de TDAH é uma delas. Porém, sem que isso implique o desgaste de quem tenta ajudar. São, geralmente, pessoas que sofrem muito no seu íntimo, cuja autoestima é paupérrima e o desnorte assustador, sendo que algumas delas têm a perfeita noção que algo não está certo com elas próprias e que sozinhas nunca se conseguirão superar, mesmo que teimem em enveredarem pelos mesmo inconsequentes procedimentos.
Boa sorte.